Aldeia Kaiowá, Tukuaryty, 1994 - Paranhos, MS
© João Roberto Ripper. Coleção Pirelli-MASP
DIREITOS INDÍGENAS E DESAFIOS CONTEMPORÂNEOS
DO MOVIMENTO INDÍGENA
DO MOVIMENTO INDÍGENA
Divulgamos abaixo novo comunicado do Aty Guassu. Este comunicado é muito importante porque ele informa com bastante clareza os direitos indígenas contemporâneos e falam dos desafios que estão enfrentando para garantir estes direitos. Proponho uma leitura carinhosa e uma ampla divulgação. É importante que todos conheçam os direitos indígenas e a legislação que os garante.
Prezados (as)
Esta nota é para divulgar.
NOTA DA ATY GUASU GUARANI-KAIOWÁ-MS
O objetivo desta nota do conselho da grande assembleia Guarani-Kaiowá Aty Guasu é destacar os direitos indígenas garantidos na Constituição Federal de 1988. A princípio a Constituição Federal de 1988 reconhece os povos indígenas integralmente como ser Humana e capaz, passando a possuir os direitos humanos. Até a Constituição de 1988 o Estado Brasileiro atribuía aos povos indígenas a condição de “relativamente (in)capazes”, ou seja, nós indígenas fomos há séculos juridicamente considerados como sub-humano, nós “índios”não teríamos a condição e capacidade Humana, não éramos tratados como pessoas humanas, por essa razão mesmo foi criada órgão indigenista tutor. Importam explicitar que a Constituição Federal de 1988, art. 231: reconhece os direitos à nossa organização social, costumes, línguas, crenças e tradições. Assim, a partir de 1988 a tutela indígena e incapacidade dos índios são juridicamente superadas, portanto nós indígenas passamos a ser compreendido como sujeito de direitos, humanas e cidadão primeiro brasileiro. Essa Lei Federal garante-nos os direitos de recuperar as terras que tradicionalmente ocupamos. Além disso, temos direitos de nós manifestarmos, propor e lutar pelas políticas públicas específicas de reparação, visto que fomos historicamente taxados de não humano, explorados, massacrados, expropriados e expulsos de nossos territórios antigos. Neste sentido amplo, o Estado-Nação Brasileiro possui imensa dívida com nós indígenas. Até o momento, apenas duas políticas públicas específicas (saúde indígena e educação escolar indígena) foram em parte implementadas para atender especificidades dos povos indígenas. Apesar da existência de nosso direito a recuperar as nossas terras antigas, porém entendemos que até hoje não há ainda uma política clara do Governo Federal para efetivar a demarcação definitiva das nossas terras tradicionais, isto é, em nossa visão não existe uma posição e ação segura do Estado-Nação e da Justiça para efetivar a devolução da parte dos nossos territórios tradicionais reivindicados. Exemplo: a identificação e demarcação de nossos territórios Guarani-Kaiowá iniciadas pela Fundação Nacional dos Índios (FUNAI) ao longo das décadas de 1990 e 2000 se encontram todas paralisadas nas Justiças.
Diante desse contexto histórico, gostaríamos de evidenciar que em geral, nós povos indígenas temos também direitos garantidos nos documentos internacionais importantes, tais como: a Convenção nº 169 sobre Povos Indígenas e Tribais em Países Independentes da Organização Internacional do Trabalho (OIT, 1989), ratificada pelo Brasil por meio do Decreto nº 143 de 25 de julho de 2002; a Declaração das Organizações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas (ONU, 2007); e a Convenção sobre a Proteção e Promoção da Diversidade das Expressões Culturais da UNESCO ratificada pelo Decreto nº 485, de 19 de dezembro de 2006.
Estes documentos reconhecem a contribuição dos povos indígenas para a diversidade cultural, considerada “patrimônio comum da humanidade” (ONU, 2007; 2) e para a formação das sociedades nacionais e de suas identidades socioculturais, apresentando uma série de diretrizes para que os Estados Nacionais desenvolvam ações voltadas para a efetivação “dos direitos sociais, econômicos e culturais desses povos, respeitando sua identidade social e cultural, costumes, tradições e suas instituições” (OIT, 1989: 23). A Convenção da Diversidade das Expressões Culturais, por sua vez, recomenda aos Estados adotarem medidas para proteger e promover a diversidade cultural considerando esta como estratégica para o desenvolvimento sustentável nacional e internacional.
Compreendemos que a Constituição do Brasil de 1988 e os marcos legais estabelecidos pelos Organismos Internacionais instauraram as bases para o desenvolvimento de políticas públicas específicas voltadas para a efetivação dos nossos direitos diferenciados como os povos indígenas primeiros brasileiros. Importante dizer que as nossas diferenças culturais constituem um dos fatores determinantes para a criação de programas e políticas governamentais particulares. Desse modo, as nossas histórias, culturas e direitos acabam por indicar a construção das políticas públicas específicas nas áreas de: educação, saúde, cultura, segurança/defesa dos territórios tradicionais entre outros.
Como já dito, até hoje, há duas políticas públicas criadas para atender as especificidades dos povos indígenas nos setores da saúde e da educação. Por meio da Portaria nº 254 de 31 de janeiro 2002 o Ministério da Saúde aprova a Política Nacional de Atenção à Saúde Indígena que visa compatibilizar a Lei Orgânica da Saúde (Lei nº 8.080/1990) com a Constituição Federal. O principal objetivo desta política é garantir aos povos indígenas o acesso à atenção integral e diferenciada à saúde considerando a diversidade sociocultural destes povos, bem como a eficácia suas medicinas tradicionais e o direito às suas culturas. Para tanto, foi criado no âmbito do Sistema Único de Saúde, o Subsistema de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas que institui os Distritos Sanitários Especiais Indígenas como forma de organização de serviços em espaços etno-culturais delimitados (Ministério da Saúde, 2002; 13).
No caso da educação a Constituição prevê o direito dos povos indígenas a terem acesso à educação formal diferenciada configurada pelo ensino bilíngue – português e línguas indígenas – e pela utilização de processos próprios de aprendizagem. A Lei nº 11.645, de 10 de março de 2008, torna obrigatório à inclusão de conteúdos de história e cultura indígena no currículo oficial da rede de ensino nacional. Enquanto o Decreto nº 6.861, de 27 de maio de 2009, dispõe sobre a educação escolar indígena e a sua organização dos territórios etnoeducacionais, regulamentando o direito constitucionalmente garantido.
Enfim, de modo similar, pensamos que seria necessário se construir uma política do Estado para a devolução/demarcação definitiva das partes de nossas terras tradicionalmente ocupadas por nós Guarani-Kaiowá do Mato Grosso do Sul.
Artigo 26 1. Os povos indígenas têm direito às terras, territórios e recursos que possuem e ocupam tradicionalmente ou que tenham de outra forma utilizado ou adquirido.2. Os povos indígenas têm o direito de possuir, utilizar, desenvolver e controlar as terras, territórios e recursos que possuem em razão da propriedade tradicional ou de outra forma tradicional de ocupação ou de utilização, assim como aqueles que de outra forma tenham adquirido. 3. Os Estados assegurarão reconhecimento e proteção jurídicos a essas terras, territórios e recursos. Tal reconhecimento respeitará adequadamente os costumes, as tradições e os regimes de posse da terra dos povos indígenas a que se refiram.
Cientes de nossas histórias e direitos, como povos indígenas, nós lideranças da Aty Guasu Guarani-Kaiowá vamos lutar reiteradamente pela efetivação dos nossos direitos no Estado do Mato Grosso do Sul e Brasil.
Atenciosamente,
28 de fevereiro de 2012
28 de fevereiro de 2012
Os membros do Conselho da Assembleia Geral Aty Guasu Guarani-Kaiowá-MS
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